Brasil lidera emergentes no consumo de analgésico



Veículo: Valor Econômico

Jornalista: Vanessa Dezem

Um mercado dentro do setor farmacêutico que movimenta globalmente US$ 26 bilhões, caracterizado por produtos com forte presença no dia a dia das pessoas. É daí que vem a força do segmento de analgésicos - medicamentos para o combate de dores de cabeça, nas costas e muscular - o maior dentre os isentos de prescrição médica (OTC), que cresce e mobiliza as empresas a inovarem e aproveitarem um dos poucos filões do setor farmacêutico que têm resistido ao forte avanço dos genéricos.

De 2006 a 2010, o mercado global de analgésicos cresceu 27%, segundo dados da consultoria americana IMS Health. No Brasil, esse segmento movimentou US$ 902 milhões em 2010, número que coloca o país no patamar de líder entre as nações emergentes e sexto maior mercado do mundo. No ranking, o Brasil fica atrás de gigantes, como EUA e Alemanha, e supera fortes economias como o Japão e a Espanha.

Dentro da classe de medicamentos OTC - que significa cerca de um terço do total do setor farmacêutico brasileiro - os analgésicos representam 14%. E é para aproveitar essa fatia importante que as empresas têm investido em lançamentos e muita divulgação.

A farmacêutica suíça Nycomed - que recentemente foi adquirida pela japonesa Takeda, por € 9,6 bilhões - lidera a lista da IMS Health das maiores fabricantes de analgésicos do país. A empresa tem como seu carro-chefe o Neosaldina - medicamento composto de dipirona, isometepteno e cafeína. A marca tem uma participação de cerca de 17% dentro da categoria de analgésicos no Brasil, segundo dados da própria companhia. Hoje, o Neosaldina representa 60% de todas as vendas em valores da área de OTC da multinacional no país que, por sua vez, representa 45% do faturamento anual da subsidiária, segundo dados IMS/PMB. Em 2010, a Nycomed registrou faturamento de R$ 633,5 milhões.

O setor de analgésicos no Brasil movimentou US$ 902 milhões em 2010. O país é o 6º maior mercado do mundo.

"É uma marca na qual a gente investe quase o proporcional do que ela representa em OTC. Aplicamos em comunicação, vendas e pesquisa", afirmou a diretora de marketing de OTC da Nycomed, Laís Rosin.

Na Pfizer, a representatividade da classe analgésicos também é importante: o segmento é responsável por 14% dos resultados da divisão de consumo da multinacional, que totalizaram R$ 183,6 milhões em 2010. Em 2008, a empresa lançou no país o Advil, cujo princípio ativo é o ibuprofeno. Com o crescimento das vendas, o medicamento - que tinha atuação apenas em São Paulo e no Rio de Janeiro - passou a estar presente em território nacional neste ano. Com os resultados, a empresa prevê que a participação do segmento analgésicos dentro do braço de consumo da subsidiária alcançará 18% até dezembro.

O motivo do alto consumo de analgésicos é simples: eles são medicamentos que tentam solucionar dores comuns, geradas por fatores múltiplos do dia a dia, como estresse, má alimentação, má noite de sono etc. "Você não precisa estar doente para ter essas dores. Muitas vezes a causa da dor não é rapidamente identificada, mas a dor tem de ser combatida", afirma a diretora médica da área de consumo da Pfizer, Patrícia Rangel. A força da classe C brasileira e o aumento da renda da população também são fatores de impulso das vendas desses produtos.

Segundo estudo realizado pela Pfizer em 2007, as dores que as pessoas mais sentem são as de cabeça - 85% dos entrevistados afirmaram que essa é uma dor que os costuma afligir - e as musculares (19%). As mulheres jovens, entre 20 e 34 anos, da classe C, são as que têm dores de cabeça com maior frequência.

Diante de tal potencial de demanda, estão hoje registrados no mercado brasileiro mais de 380 produtos analgésicos, segundo a IMS Health. Para se destacar no meio de tantos fabricantes, as empresas estão investindo em inovação - uma iniciativa não muito fácil: em um mercado que existe há anos, já consolidado, surge a dúvida se há algo ainda a ser inventado.

"Hoje, a inovação acaba vindo muito mais pela embalagem e pela forma de apresentação", afirmou Laís, da Nycomed. Ela conta que, até 2005, a empresa só oferecia ao consumidor caixas de 20 drágeas da Neosaldina. Quando a multinacional lançou a embalagem com quatro drágeas, verificou um forte crescimento nas vendas.

A solução da Pfizer, por sua vez, foi mudar o princípio ativo. A empresa optou pelo ibuprofeno - ao invés da dipirona sólida, que está entre as mais utilizadas no país - e passou a oferecer o produto em cápsulas líquidas, conhecidas por não agredir o estômago. "São novos formatos, embalagens e formas de atuação que surgem", afirma o diretor de Marketing da Pfizer Consumer Healthcare, Sydney Rebello.

As inovações fazem as marcas serem mais conhecidas e procuradas, o acaba sendo um limitador do avanço dos genéricos no segmento. "Os genéricos não canabalizaram as marcas", explica a diretora da Nycomed. Segundo a executiva, algumas marcas estão estáveis em termos de vendas e outras continuam crescendo.

A EMS, uma das principais fabricantes de genéricos do país, por outro lado, mostra um avanço do segmento. Com 21,5 milhões de unidades comercializadas entre abril do ano passado e março deste ano, a área de analgésicos da empresa registrou crescimento de 50%. Dentre seus principais produtos estão os genéricos dipirona e paracetamol.

Essa alta concorrência e a evolução da demanda no país cada vez mais fazem com que a renovação da lembrança das marcas de analgésicos junto aos consumidores se torne uma forte arma da indústria. "Há espaço. E esse mercado continua em uma ascendente", conclui Rebello.

Contexto

Os medicamentos analgésicos podem ser classificados como opioides e não-opioides.

Os primeiros modulam a transmissão do estímulo doloroso. Um exemplo de opioide é a morfina. Os não-opioides, por sua vez, inibem a produção das substâncias que transmitem a dor, mas as pesquisas ainda são inconclusivas sobre seu mecanismo exato de ação. Dentre os medicamentos mais conhecidos dessa classe estão o paracetamol e a dipirona. Os não-opioides são um tipo de OTC.

Dipirona é vetada na UE e liberada no país

Depois que a dipirona - princípio ativo de diversos analgésicos - começou a ser amplamente consumida nos países europeus, órgãos especializados do continente questionaram se o seu uso estaria associado ao desenvolvimento de agranulocitose - um tipo de distúrbio sanguíneo - atingindo principalmente as crianças.

Esses questionamentos geraram um alerta em todo o mundo. O uso de dipirona é seguro? Segundo explica a chefe do núcleo de notificação e investigação em vigilância sanitária da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Maria Eugênia Cury, no Brasil, não há nenhuma prova científica de que haja qualquer relação entre o princípio ativo e a doença sanguínea.

"Essa relação tem características regionais", afirmou Cury. Ela destaca as diferenças étnicas nas populações como uma das razões que fazem com que os organismos reajam de modo diferente.

A executiva conta que, após os questionamentos da Europa sobre os riscos do medicamento, foram desenvolvidos diversos estudos sobre o assunto. Um deles, em especial, analisou a incidência e os fatores de risco para agranulacitose em países latino americanos. As conclusões foram reveladoras: a taxa de incidência da doença em países europeus aumenta quando a dipirona é utilizada, enquanto nas populações dos países da América Latina, essa taxa cai.

"Não tem significânica estatística provada para a relação entre dipirona e a doença nos países latinos. Já na Europa, os órgãos responsáveis entenderam que existe um risco na utilização da dipirona, por isso tiraram o produto do mercado", enfatizou Cury.

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