Reckitt Benckiser muda estrutura e acelera lançamentos
Boa parte da meta da inglesa Reckitt Benckiser de aumentar de 44% para 50% a participação dos mercados emergentes na receita global em 2015 está sob a responsabilidade do brasileiro Roberto Funari. Em fevereiro, ele assumiu a vice-presidência para América Latina, Ásia e Pacífico da empresa, o que inclui Brasil, Índia e China, três dos quatro Bric - fica de fora só a Rússia. A escolha de seu nome certamente está mais relacionada a sua experiência de 12 anos como executivo internacional do que a sua nacionalidade, mas não deixa de ser emblemática: na nova configuração da Reckitt, dona das marcas Veja e Vanish, o Brasil ganhou mais peso.
Este ano, a filial brasileira, décima maior entre as 60 da companhia no mundo, passou a ser a base da operação na América Latina (antes o comando da região ficava em Miami), se reportando diretamente a Funari, que faz parte da diretoria executiva da companhia. A unidade ganhou uma área maior de pesquisa e desenvolvimento, voltada para o país, a região e mercados globais, que recebeu 25% mais investimentos no ano passado, em relação a um ano antes. Também acelerou lançamentos: foram 30 novos produtos em 2012, ante 15 em 2011. Até dezembro, segundo Funari, outros 30 devem ser lançados.
De sorriso fácil, o executivo não titubeia diante de questões sobre a desaceleração econômica brasileira e a depreciação das moedas asiáticas, como a rúpia indiana, entre outros aspectos conjunturais que vêm arrefecendo o entusiasmo de analistas e investidores com os mercados emergentes. "Nosso investimento no Brasil e nesses países-chave é de longo prazo", afirma. "Embora as notícias recentes não sejam favoráveis, os alicerces macroeconômicos permanecem, principalmente a ascensão de uma nova classe de consumidores e a crescente urbanização", acrescentou, lembrando também que a recuperação do Japão e dos Estados Unidos podem ter impactos positivos nesses mercados.
A companhia vê os próximos anos como um "momento único" para os fabricantes de bens de consumo. Funari cita pesquisa da Mckinsey segundo a qual de 2010 a 2025, o mercado consumo nos países emergentes vai passar de U$ 12 trilhões para US$ 30 trilhões. "Nunca houve um delta de crescimento como este", afirma. Este é o mote que vem direcionando a estratégia da Reckitt desde que o indiano Rakesh Kappor assumiu como CEO mundial em setembro de 2011 e que motivou o redesenho da empresa para obter metade de sua receita fora da Europa e da América do Norte até 2015.
Além desse foco, outra grande meta é aumentar a participação de higiene e limpeza no portfólio de 67% para 72% no mesmo período. Embora, seja mais conhecida no Brasil por seus produtos de limpeza, nos últimos anos a empresa vem investindo fortemente em produtos de saúde, com aquisições e parcerias com fabricantes de vitaminas e medicamentos sem prescrição. A área é a que mais cresce na multinacional, a taxas ao redor de 30%. "Já somos a sétima maior empresa de OTC (medicamentos que dispensam receita médica) do mundo", afirma Funari.
A filial brasileira tem papel relevante para alavancar as vendas nessa área. O objetivo, segundo o executivo, é estar entre as cinco maiores empresas de medicamentos sem prescrição do país em cinco anos. Não é a única fabricante de bens de consumo de olho nesse segmento. Com diversas aquisições, a brasileira Hypermarcas tornou-se a líder desse mercado, que movimenta cerca de R$ 14 bilhões. Além da conhecida concorrente, a Reckitt também terá de disputar espaço com grandes laboratórios farmacêuticos como Sanofi, Bayer e Pfizer.
Até este ano, o portfólio da multinacional inglesa nesse segmento no Brasil incluía apenas o antiácido Gaviscon e a pastilha para garganta Strepsils. Um acordo de US$ 482 milhões fechado em maio com a Bristol-Myers Squibb para distribuição de produtos da farmacêutica na América Latina ampliou esse mix. No Brasil, o contrato significa o direito de vender o antigripal Naldecon, a pomada para assaduras Dermodex e o antigases Luftal. E outros itens do portfólio mundial da Reckitt no segmento estão por vir, diz Funari, sem revelar as marcas.
Não significa que os produtos de limpeza da multinacional ficarão em segundo plano. Marcas como Veja e Vanish são consideradas estratégicas pela companhia e continuam no topo dos investimentos. "Olhamos muitas oportunidades de penetração dessas marcas nos grandes centros urbanos", diz Funari. Um exemplo é o alvejante sem cloro Vanish que ainda tem uma penetração baixa nos lares das classes C, D e E. Para atingir esse consumidor, que em grande parte não tem máquina de lavar automática, a companhia lançou em junho uma versão do Vanish em pedra (um sabão que também tira-manchas), que custa R$ 2,99.
Outro lançamento recente, desta vez orientado para gostos regionais, foi o limpador Veja com aroma de pitanga, desenvolvido para o Nordeste. Um tipo de ação que só é possível, segundo Funari, quando a área de pesquisa é bem estruturada e há uma relação mais direta com a matriz, que acelera as decisões - atributos que foram conquistados pela filial na nova organização da multinacional.
São armas importantes também para enfrentar um mercado bastante disputado, que conta com gigantes como Unilever e com uma infinidade de fabricantes regionais. "Só Veja tem mais de 100 concorrentes", diz o executivo. Segundo dados da Euromonitor, tanto a Unilever quanto a Reckitt perderam participação no mercado de limpeza de 2010 a 2012: a fatia da concorrente, que lidera as vendas do setor, passou de 24,6% a 23,2%. A participação da Reckitt, segunda colocada, caiu de 13% para 12,8%.
Mesmo assim, as vendas da companhia no país vêm crescendo a taxas superiores às de outros mercados. No primeiro semestre, a receita da região que inclui América Latina cresceu 11%, para 1,28 bilhão de libras esterlinas (US$ 1,97 bilhão), puxada por Índia, Brasil e China. Funari diz que a expectativa é manter esse patamar em 2013. O lucro operacional dessa área - que responde por 29% da receita total - subiu 11%, enquanto o resultado operacional global caiu 15%, afetado por gastos com aquisições e a reorganização da companhia, mas principalmente por provisões relacionadas a processos de direito da concorrência em alguns países, segundo relatório de resultados apresentado em julho.
No ano passado, a Reckitt registrou receita total de 9,56 bilhões de libras (cerca de US$ 15 bilhões), um avanço de apenas 1% sobre 2011. A região que engloba o Brasil e a Ásia apresentou a maior alta, de 5%. Excluindo os efeitos cambiais o avanço foi de 11%.
Aos 47 anos, Funari está na sua segunda passagem pela multinacional. Na primeira, ficou 12 anos e ocupou diversos cargos de liderança não só no Brasil, mas também na Holanda, na África do Sul, na Alemanha e na matriz da companhia em Londres. Saiu da Reckitt para assumir uma posição na diretoria global da Imperial Tobacco, onde ficou dois anos. Está fora do Brasil desde 2001 e vai continuar, embora seu objetivo seja visitar o país a cada três meses: seu escritório fica em Cingapura -- localização estratégica para os principais mercados asiáticos.
Veículo: Valor Econômico
Jornalista: Luciana Marinelli
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