Antibióticos voltam a atrair investimento de farmacêuticas



Por anos, as companhias farmacêuticas abandonaram a pesquisa de novos antibióticos, afirmando que ela não valia a pena. Agora, algumas estão mudando de ideia.
Depois de ter desmontado a equipe encarregada de pesquisar antibióticos em 1999, a suíça Roche Holding AG está contratando um profissional para liderar e recompor sua área de medicamentos contra infecções. No ano passado, a Roche licenciou um novo antibiótico da firma de biotecnologia Polyphor Ltd. e investiu US$ 111 milhões em outra empresa especializada em antibióticos, a RQX Pharmaceuticals Inc.
Já a GlaxoSmithKline PLC, gigante do Reino Unido, informou recentemente que vai receber US$ 200 milhões em financiamento do governo americano para seu programa de antibióticos.
A Roche e a Glaxo estão se juntando a algumas outras grandes do setor farmacêutico, como AstraZeneca PLC e Novartis AG, no que está sendo um esforço para descobrir e desenvolver novos antibióticos.
Nos últimos 15 anos, as farmacêuticas abandonaram o desenvolvimento em massa de antibióticos, alegando custos altos de pesquisa, retornos baixos e regulação pesada. Nos anos 80, 30 novos antibióticos foram aprovados nos Estados Unidos, comparado com apenas um entre 2010 e 2012.
A Pfizer Inc., uma das pioneiras na produção em massa da penicilina, encerrou suas atividades de pesquisa de antibióticos em 2011, juntamente com a Johnson & Johnson. Em 2002, a Eli Lilly & Co. deixou o setor para se concentrar em doenças crônicas. A Sanofi SA, por sua vez, fechou sua unidade de anti-infecciosos, a Novexel, em 2004.
"Não estávamos tendo sucesso desenvolvendo novas abordagens para infecções bacterianas difíceis de serem tratadas", diz Charles Knirsch, vice-presidente de pesquisa clínica da Pfizer. "Depois de muita avaliação, decidimos que aumentar o foco na prevenção de infecções representaria um retorno sobre investimento mais prudente." Felizmente para a saúde pública, as condições econômicas desfavoráveis estão mudando. Os reguladores dos EUA e da Europa recentemente tomaram medidas para remover os obstáculos ao desenvolvimento de antibióticos, com os EUA dando prioridade à revisão de novos remédios.
Os fundos para pesquisa também estão começando a crescer. A União Europeia financia projetos de pesquisa de antibióticos em empresas e universidades. Fundos do governo americano são acessíveis para empresas que desenvolvem novas moléculas promissoras.
Além disso, modelos comerciais alternativos estão sendo discutidos como forma de contornar o problema dos baixos volumes de vendas: entre elas, a venda de drogas novas em grandes quantidades a prestadores de atendimento na área da saúde para que eles as usem quando necessário ou a cobrança de uma tarifa de licenciamento fixo para o acesso aos medicamentos.
A necessidade de novos antibióticos é enorme. Hoje, infecções resistentes a antibióticos matam cerca de 50.000 pessoas por ano nos EUA e Europa, um número que está crescendo, segundo a Organização Mundial da Saúde. Nos EUA, dois milhões de pessoas por ano vão contrair uma infecção resistente a medicamentos, gerando um custo de US$ 20 milhões em despesas de saúde, segundo o Centro para Controle e Prevenção de Doenças do país.
O uso excessivo de antibióticos aumentou a resistência das bactérias a eles, tornando os remédios atuais menos eficazes. O emprego generalizado em animais criados para corte introduziu mais antibióticos na cadeia alimentar, o que também reduziu a eficácia deles.
Com um número menor de novos medicamentos para receitar, e os antigos frequentemente falhando no combate às cepas resistentes a medicamentos, os médicos às vezes são forçados a usar drogas mais antigas e mais tóxicas.
"Os antibióticos que eram fáceis de descobrir se esgotaram", diz Brad Spellberg, um especialista em doenças infecciosas do Instituto de Pesquisa Biomédica de Los Angeles.
Mesmo quando o antibiótico chega ao mercado, remédios contra o câncer, por exemplo, são em média três vezes mais lucrativos. Remédios para os ossos e a musculatura geram um retorno dez vezes maior, segundo estimativas de um relatório de 2009 da Escola de Economia e Ciência Política de Londres.
Por exemplo, o ceftarolina fosamil, um antibiótico aprovado nos EUA em 2010, custa cerca de US$ 600 no país para um tratamento de uma semana. Em comparação, o yervoy, um novo medicamento contra melanoma, custa US$ 120.000 para um tratamento de 12 semanas.
"A sociedade avalia os antibióticos de forma errada", diz David Payne, chefe de pesquisa antibacteriana da GlaxoSmithKline. "Esses remédios salvam vidas; eles não apenas dão ao paciente alguns meses a mais [de vida]." John Rex, diretor da área de infecções da AstraZeneca, que tem atualmente um dos portfólios mais fortes de antibióticos em desenvolvimento, admite que sua unidade não é um motor econômico do mesmo porte que a oncologia. "A matemática é clara", diz. "Ela é difícil para toda a indústria de anti-infecciosos."

Ao contrário das drogas contra doenças crônicas, os antibióticos são tomados por uma semana ou duas, o que limita as vendas. Aqueles mais receitados, incluindo a azitromicina e a amoxilina, são agora vendidos como genéricos de baixo preço.
Cobrar preços mais altos poderia estimular o desenvolvimento. Num artigo recente publicado na revista científica "Nature", Spellberg e Rex argumentam que um novo remédio hipotético contra a Acinetobacter baumannii, que causa infecções hospitalares, poderia ser vantajoso para provedores de saúde mesmo a um preço de US$ 30.000 por período de tratamento.
A Aetna e a Cigna, grandes seguradoras de saúde dos EUA, não quiseram comentar sobre um preço hipotético, mas o Nice, conselho consultivo de preços do Reino Unido, já recomenda o uso de dois remédios contra câncer que custam mais, considerando o tempo de vida adicional que proporcionam aos pacientes.
Enquanto a maioria das grandes farmacêuticas continua a investir em outras áreas, algumas empresas menores estão se aventurando no setor. As farmacêuticas de pequeno e médio portes respondem agora por 73% dos antibióticos em desenvolvimento, segundo estatísticas da BioPharma.
A Cubist Pharmaceuticals, que é sediada em Boston e foi criada em 1992, tem hoje três antibióticos aprovados e um valor de mercado de US$ 5 bilhões.
Outra novata de Boston, a Enbiotix, está conversando com várias grandes farmacêuticas interessadas em fazer negócio, inclusive aquelas que não têm uma divisão de anti-infecciosos, disse Jeff Wager, diretor-presidente da Enbiotix.
"Os antibióticos nunca serão grandes campeões de venda", diz ele. "Ainda assim, a resposta imediata é que precisamos desses remédios. Não creio que uma grande farmacêutica possa chamar a si mesma de uma grande cidadã corporativa sem eles."

Veículo: Valor Econômico
Jornalista: Hester Plumridge, The Wall Street Journal

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

All Farma - Mogi das Cruzes

Roche aposta em novas drogas contra o câncer no Brasil